Você nem deve ter percebido, mas nesta semana completamos cem dias do decreto de início da pandemia no Brasil.
Como vivenciamos muitos relatos sobre como a rotina mudou e teve de ser adaptada a uma nova realidade, resolvemos ouvir quem, há muito tempo, vive sob um outro prisma.
Foi dada aos nossos personagens a liberdade para compor esse texto. A nós, coube narrar e exercitar o nosso olhar para uma visão mais ampla sobre o que realmente é ou não é limitação.
Confira nas próximas linhas abaixo!
Paula, ô mulher linda
1º PERSONAGEM
*Minha vida era normal. Trabalhava, saía de casa com minha bike adaptada e até com minha cadeira, antes da pandemia. Enfrentava limitações, como a falta de acessibilidade em calçadas, prédios e comércios, mas, agora, além das limitações de uma pessoa com deficiência (as quais não me impedem, pois busco transpô-las), a maior dificuldade é não sair de casa mais devido à pandemia.
Fernanda Zanin nasceu com uma doença rara, chamada Artogripose (ancilose congênita das articulações das extremidades/ retenção de uma articulação em uma posição fixa). “Após 13 cirurgias, recebeu o diagnóstico que ficaria paralítica.
Até ouvir a querida Fernandinha, você tinha parado para pensar que 42 % das cidades brasileiras não são adaptadas para receber cadeirantes e permitir a eles o livre acesso ao trabalho, lazer etc?
2º PERSONAGEM
Alice nasceu no dia 18 de junho de 2020. Quando a mãe de primeira viagem recebeu a notícia da gravidez, em 2019, nem de longe imaginava que o mundo passaria por esse caos. As dúvidas de uma iniciante no assunto triplicaram diante da insegurança causada pela COVID-19. Mesmo com a bebê no ventre, Emília teve como companheiro o cuidado redobrado nos meses de gestação.
“Eu adaptei minha rotina pela Alice: até o início do mês era um ser vivo que crescia em meu ventre e, mesmo tão pequena, já me apresentava a grandeza de uma vida nova. As minhas limitações em relação às festividades comuns à gestação e até as visitas, me mostraram um outro jeito de viver. Tripliquei minha fé nesse período e percebi uma proteção divina, além do amor de minha família e dos amigos. Alice nasceu bem e é tão boazinha”.
Emília Augusta é uma daquelas irmãs que a vida dá pra gente. Assim como eu, nem se imaginava mãe. Agora com Alice nos braços, vê que todas as limitações valem a pena para quem ama e acredita que, dias que parecem ruins, nos ensinam.
A gravidez de risco habitual é aquela na qual, após avaliação pré-natal, não se identifica maiores riscos de complicações para mãe e/ou bebê. Mas há também a gestação de alto risco, na qual se identificam doenças maternas prévias que podem colocar em risco a vida materna e/ou fetal. Mas no caso do coronavírus, as gestantes que estiverem no grupo de risco por qualquer comorbidade, devem ter atenção redobrada, já que ainda não é confirmado se a mãe pode transmitir ao bebê a doença durante a gravidez.
E essa sua rotina de impedimento de ir ao shopping, trabalho, aula e demais atividades, há muito tempo vivem os pacientes que tratam doenças, por vezes, tidas como incuráveis.
3º PERSONAGEM
Com a slogan, * A Cura não pode parar*, a Casa Ato, de Guaratinguetá e Lorena, tem dado continuidade ao seu trabalho de apoio às pessoas que precisam da cura do câncer pelo amor. É lá que elas encontram o amparo psicológico, assistencial e até social.
E como precisam desse cuidado! Não é preciso ir muito longe pra ver como o tratamento oncológico foi afetado neste período de pandemia. Muitos foram cessados, seja por falta de planejamento, seja pelo cuidado com o paciente, foi o caso de Porto Alegre (RS).
-Lembro-me muito bem de como o meu pai, João Batista, tinha uma rotina limitada pelo tratamento do câncer. Durante a quimioterapia, eram dez dias bons e dez dias ruins (indisposto). Recordo-me também dos cuidados com sua saúde, no sentido de manter a imunidade equilibrada, para evitar qualquer outro tipo de doença- Lilian de Paula
Neste contexto, em que o abraço foi limitado, olha só como essa mulher maravilhosa ressignificou a forma de abraçar. Dona Paula se alimenta do amor dos filhos e dos amigos.
Ela transformou o saco bolha no escudo contra o coronavírus. A montagem pode até estar exótica, mas é, sem dúvidas, uma das maiores provas de amor demonstradas neste período. DETALHE: Mesmo protegida, ela ainda não usou e não abraçou ninguém!
Não é a primeira vez que o mundo é assolado por uma situação assim.
Basta olharmos no retrovisor da história para nos depararmos com a gripe espanhola. Em relatos de pessoas da época, percebe-se que pouco aprendemos com ela, ao contrário, parece que repetimos erros. Aqueles que viveram a “ESPANHOLA” deixaram muitos relatos dos tempos sombrios que foram encobertos pelo carnaval da década de 1920. Mesmo assim, os dias cinzentos continuaram a fazer parte da lembrança das pessoas que viveram aquele período. Porém devemos lembrar que tratava-se de uma época que não tínhamos acesso ao digital, situação que fez com que este momento propusesse outros significados. Desta vez, para aqueles que possuem o acesso e enxergam no problema, oportunidades, foi possível criar novas e boas histórias. O que não redime, de maneira alguma, a gravidade da doença, mas que em grande parte gera possibilidades, onde o virtual não chegou, pessoas descobriram novas formas de se solidarizar. Fato é, não podemos esperar a pandemia passar, temos que agir, fazer com o que temos, para que, quem sabe, contarmos essa história de um outro jeito.
Como será que irão narrar a história da pandemia no futuro? A doença que além de levar vidas, nos fez seres humanos piores, ou o momento em que apesar de termos sido desafiados pela dor, nos superamos e fizemos uma sociedade mais solidária e próspera.
Autores:
Fernanda Zanin |37 anos | Administradora | Funcionária de uma instituição de ensino.
Emília Augusta | 37 anos |Advogada | Mãe de Alice.
Casa Ato, Casa de Apoio ao paciente com câncer, Unidades Guaratinguetá e Lorena
João Batista dos Santos | 74 anos |quando faleceu, em 2019 | Eletricista | Pai exemplar | Amigo vitalício
Diego Amaro de Almeida, Professor | Mestre em História Social
Lilian de Paula Santos, Jornalista | Mestra em Ciências Ambientais
Vocês são maravilhosos quanto exemplo, quanta força nos mostra esse texto. E me fez pensar em um futuro como irei contar a minha história e dos meus filhos como essa pandemia nos virou no avesso, como trouxe coisas boas e ruins como tudo na vida. Lilian de Paula vc é um exemplo minha prima, irmã de alma e coração Parabéns ao Diego um dia terei o prazer de te conhecer pessoalmente.
ResponderExcluirO depoimento acima é da prima Regina Alice
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